domingo, 14 de setembro de 2008

O LIVRO











Parou o carro e olhou ao redor, o cheiro de grama molhada entrava pelas suas narinas refrescando seus pulmões...o verde intenso das árvores e dos pinheiros de várias espécies desenhavam o cenário para ela...
Desceu do carro, a direita ficava a recepção da pousada que serviria de refugio para os seus textos...
Lá estava dona Lucinda, proprietária daquela maravilha...sorriso nos lábios, cabelos ruivos, estatura mediana e curvas bem arredondadas...pessoa bem humorada e generosa...
Dona Lucinda a tratou como se já a conhece-se de longa data...
—Querida, seja bem vinda, temos algumas cabanas desocupadas, pode escolher onde quer ficar...
— Sim, claro, vou dar uma volta para ver o local...
Caminhou acompanhada por um rapaz, ágil e bem falador... Nuno era seu apelido, fez ela entrar em todas as cabanas e dava detalhes do lugar que dizia respeito a ela... achou estranho a tal afinidade entre eles e prosseguiu...ela tinha a sensação que as pessoas já a conheciam...avistou uma cabana perto do riacho onde a varanda dava para uma corredeira que atravessava a fazenda...
— Perfeito Nuno, ficarei aqui!
E lá foram eles buscar a bagagem...
Depois de arrumar todas as suas coisas, sentou-se na varanda e fez um reconhecimento do local que ficaria por um bom tempo...pelo menos o tempo necessário para ter a história do seu novo livro...toda vez que ela iniciava uma história, mau começava, jogava o arquivo fora... achava que não teria repercussão, as histórias eram pouco comerciais, exatamente o que a editora para quem trabalhava não queria...era difícil para ela entrar neste mundo literário... então por onde começar?
Passaram alguns dias e nenhuma inspiração...nenhum texto...
Numa manhã cinzenta e muito fria, ela levanta da cama.. tremendo, liga o chuveiro deixando o banheiro completamente nublado e quente...tomou seu banho reconfortante, colocou um roupão e foi para a janela...não conseguia enxergar quase nada, apenas alguns poucos galhos dos pinheiros que ficavam em torno de sua cabana...se agasalhou e saiu para a varanda úmida e lá sentou-se com uma xícara de chá bem quente...pensou sobre sua vida e fez uma análise daquele momento tão íntimo com ela mesma...
Seus olhos perceberam a presença de um estranho...homem alto, claro, aparentando meia idade...
— Bom dia, disse ele com um cachecol cobrindo parcialmente o rosto.
— Olá, você também está hospedado aqui na pousada?
— Não, eu moro aqui a muitos anos...veio conhecer a nossa cidade serrana?
— Também, mas vim a trabalho...aceita uma xícara de chá?
— Não obrigado, na verdade eu preciso falar com você...
— Pois não...achou meio estranho e continuou...sobre o que quer falar?
— Sobre nós, disse ele com uma voz firme...
— Sobre nós? Como assim?
— Você é exatamente como nos meus sonhos, talvez um pouco mais solitária...
— Ok, acho melhor continuarmos esta conversa num outro momento, agora vou precisar trabalhar...desconfiada, não queria mais nenhuma conversa com aquele sujeito...
Ele sorriu um sorriso misterioso e se retirou...
—Passar bem...disse ele, como se prevê-se o seu desconforto.
Aquele diálogo deixou-a transtornada, se recolheu para dentro da cabana, deitou-se um pouco na cama e adormeceu...
Mergulhou num sono profundo até atingir o estado dos sonhos...(ela se via como uma criança, de vestido branco e cabelos compridos presos por uma fita branca...andava por perto de uma corredeira, escorregou e cortou sua mão em uma pedra...neste momento aparece um garotinho de bermuda azul e camiseta branca...ele se aproxima e com a ponta de sua camiseta ele limpa o sangue de sua mão)...assustada, ela desperta olha para os lados e respira fundo...
Era ela no sonho, um sonho que a muito tempo não tinha... um sonho que mexia com seus sentimentos mais profundos...
Relacionou o sonho com o homem que falou com ela a pouco...
Levantou-se e foi atrás do sujeito para tentar entender o que ele queria dizer...
Ele estava sentado em um banco perto da corredeira...
— Olá, pensei bem e gostaria que continua-se o que estava tentando falar para mim...
— Sente-se, não precisa ter medo eu não mordo...
— Você não acha que é atrevido para falar com alguém que mau conhece?
— Mas eu conheço você muito bem...
— De onde? Nunca vi seu rosto antes...
— Eu sou o garoto dos seus sonhos...
Ela levantou-se completamente assustada...
— Como sabe sobre o garoto do meu sonho? Quem é você?
— Sou o seu destino...você me pertence!
Se recuando para trás, na tentativa de se livrar daquele lunático procura alguma explicação para o que estava acontecendo...
— Não sei quem você é e não quero mais ouvir conversa fiada...seja claro!
— Por que você tem medo de mim? Eu vim para levá-la comigo, estou fazendo o que você me pediu estes anos todos...
— Eu não pedi nada...se afastando, rapidamente...ela cai na corredeira...
— Socorro, por favor eu não sei nadar, me ajude...
Ela olha para os lados apavorada...não vê mais o homem e sim o garoto dos seus sonhos...ele se aproxima, estende a mão para ela e a retira da água...atordoada, confusa...vê que o garoto também tinha desaparecido...
Nunca entendeu o que aconteceu naquele dia...
Um ano depois, lançou seu livro " O garoto dos meus sonhos"...que foi reconhecido por vários autores famosos e fez um grande sucesso em vendas.
Nunca mais ninguém soube nada sobre ela...

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